segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Rumo ao Jornalismo

Sonhos... Ideais...

Por que tantos querem ser jornalistas?“Jornalismo está na moda”, há quem diga. Mas não é só uma questão de moda. O jornalismo tornou-se atividade essencial na sociedade moderna. E tende a expandir-se como mercado de trabalho, a despeito de parecer um campo já saturado.

Para o jornalismo convergem as informações, as emoções, os saberes, os conflitos, as expectativas, as notoriedades e os mitos do tempo presente. É no jornalismo, em suas aptidões de linguagem, que se concentram, hoje, as possibilidades mais amplas e eficazes de realizar intervenções transformadoras na realidade. O jornalismo tem também o fascínio do poder. Poder próprio. E poderes alheios, dissimulados ou não, que correm pelas vias e veias da expressão jornalística.

Ademais, o jornalismo tem lá a sua dimensão de arte. A arte de reelaborar a realidade, narrando-a. Nessa arte se podem vislumbrar os encantos da liberdade de ser, dizer e fazer, que aos talentosos tanto estimula.

Por tais e tantos encantos, expande-se entre os jovens o sonho de ser jornalista.

Porém, para os que fizeram a escolha do jornalismo, nem só de sonhos se constitui o momento do ingresso no curso que os levará à carreira. Há também temores, desconfianças. Afinal, falam tão mal do jornalismo! – dizem que mente, que perdeu a independência, que só serve aos poderosos, que é um mercado sem espaço para tanta gente.

Por tudo isso, decidi dedicar este texto aos jovens ingressantes nos cursos de jornalismo. Com um recado preliminar: não permitam que maus professores, maus alunos, maus currículos, maus modelos de jornalismo e teorias trôpegas lhes destruam a capacidade de sonhar e acalentar ideais.

Trabalho e lutas

Não basta, porém, ter sonhos e ideais. Algum dia, no final do curso, haverá trabalho a fazer e lutas a enfrentar, no mundo real do jornalismo. Trabalhos e lutas que exigirão lucidez, sempre. E coragem, não poucas vezes.

Na perspectiva desse momento, aqui deixo alguns elementos para reflexões que possam aclarar e organizar, também no plano racional, as relações com a futura profissão. São duas as idéias que proponho à reflexão dos jovens estudantes de jornalismo. A primeira delas, esta:

- O mundo mudou de forma radical, além de radical, irreversível, em relação a épocas surpreendentemente recentes, nas quais se produziram os ideários, diria também os ideais do jornalismo libertário, justiceiro, poético e até aventureiro em que todos ainda gostamos de acreditar. Mas que já não vislumbramos. O mundo mudou, impulsionado pelos impactos transformadores das novas tecnologias. Aconteceu uma revolução de efeitos culturais surpreendentes, que destruiu as fronteiras (físicas, ideológicas, científicas...) ordenadoras das interações humanas, em tempos idos. Com a queda das fronteiras, desmoronaram mitos e dogmas que, em séculos recentes, deram sentido e ânimo aos embates do mundo. Por mais que a gente não goste das sociedades de hoje, a verdade é que as convicções e as formas da democracia evoluíram para melhor. Porque aumentou a percepção social das contradições.

Mas os conflitos se multiplicaram de forma assombrosa. E se tornaram complexos. Se olharmos a realidade que os jornais nos apresentam, vemos um mundo de sujeitos institucionalizados. Esses sujeitos agem de forma organizada, competente, por meio de acontecimentos, atos, falas e/ou silêncios que produzem colisões transformadoras (sociais, culturais, políticas, econômicas) e que, por isso, têm a natureza da notícia. As informações, estrategicamente produzidas, entram em redes que, de forma já incontrolável, globalizam idéias, ações, mercados, sistemas, poderes, discussões, interesses, antagonismos e acordos. E a mesma lógica se reproduz nos âmbitos nacional, regional e local, onde também a informação socializada se tornou a energia vital dos conflitos.

É nesse mundo que os jovens estudantes, ingressantes na carreira, terão de ser jornalistas e fazer jornalismo.

Conflitos e complexidades

Segunda idéia:

- As mudanças do mundo impõem novas razões e novas circunstâncias ao jornalismo - as razões éticas da democracia, em plena evolução para práticas participativas, o que significa dizer, de aprofundamento dos conflitos; e as circunstâncias da complexidade desses conflitos.

Há que compreender isso, sem renunciar à crença de que o jornalismo continua vinculado ao universo dos valores humanistas universais e a compromissos com o interesse público. Para que assim seja, é preciso encarar e equacionar a mais complicada contradição que a nova era nos coloca: o jornalismo só sobreviverá se também for negócio, fonte de lucro. Teremos, pois, de encontrar formas de gerenciar a contradição, para que o objeto do negócio e do lucro seja o jornal, não o jornalismo.

Jornal e jornalismo, negócio e linguagem, anúncio e notícia, têm de saber conviver sem se misturar. São partes solidárias, mas idealmente independentes, no processo de viabilizar, pela notícia, ações estratégicas e táticas (políticas, econômicas, culturais, ideológicas, religiosas...) que, embutidas na difusão jornalística, ora desorganizam ora reorganizam as relações e os ordenamentos sociais. Assim, como espaço público dos conflitos, o jornalismo é submetido a crescentes pressões dos interesses conflitantes envolvidos nos acontecimentos.

Em tal cenário, e sob tais pressões, o jornalismo terá que tornar-se cada vez mais um discurso independente, elucidativo e asseverador, até porque só assim poderá ser crítico, ético, confiável e educativo. Garantir à sociedade as qualidades desse discurso é o papel mais importante e mais espinhoso dos jornalistas – os que já o são e os que vêm por aí, pelas veredas do estudo.

***Recado final, aos que agora ingressam em faculdades de jornalismo: este é o vosso tempo de estudar. Estudem, pois. Leiam, pesquisem, discutam. Desenvolvam habilidades técnicas e sensibilidade estética para as artes do ofício escolhido. E desenvolvam, em tempos de estudo que jamais devem terminar, aptidão intelectual para apreender, compreender e interpretar, como narradores, o mundo complicado que o século XX nos legou.Que cada um de vocês amadureça o seu próprio ideal de jornalismo. Ideal não é coisa coletiva, mas individual. É aquilo que só existe na idéia. Pois construam sem medos, cada um de vocês, a vossa própria utopia. Façam dela fonte de sentidos para as escolhas e as lutas da vida real, no jornalismo ou fora dele. E não abram mão de um poder que é vosso, de cada um, e não dos outros: o poder de preservar os próprios ideais.

Retirado do blog do Professor Chaparro: http://www.oxisdaquestao.com.br/

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